O CURRÍCULO INFANTIL

O currículo  nas instituições de educação infantil segue as Diretrizes Nacionais para a Educação Infantil, do Ministerio da Educação e Cultura (MEC, 2009).

Veja a seguir importante artigo da Dra. Zilma de Moraes Ramos Oliveira a respeito do tema, conteúdo de consulta pública.

O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE PROPÕEM AS NOVAS DIRETRIZES

NACIONAIS?

Zilma de Moraes Ramos de Oliveira

zilmaoliveira@uol.com.br

1. APRESENTAÇÃO

Uma coisa é certa: a Educação Infantil está em grande movimentação: ao lado da

expansão de matrículas, embora ainda em número insuficiente para o alcance das

metas do Plano Nacional de Educação de 2001, tem havido significativa mudança na

forma como hoje se compreende a função social e política desse nível de ensino e a

concepção de criança e seu processo de aprendizado e desenvolvimento. Novas

propostas didáticas e pontos de vista renovados sobre o cotidiano das creches e préescolas

têm se apresentado nos encontros da área convidando os educadores a

repensar seu trabalho junto às crianças e famílias.

A inclusão, a partir da Constituição Federal de 1988, de creches e pré-escolas no

sistema de ensino, formando com o Ensino Fundamental e o Ensino Médio a Escola

Básica, apesar de já ter provocado avanços na área de Educação Infantil, como a

elevação do nível de formação dos seus educadores, necessita de instrumentos que

articule o trabalho pedagógico realizado ao longo destas etapas, sem impor o modelo

de uma etapa à outra. Nessa posição se colocam as novas Diretrizes Curriculares

Nacionais da Educação Infantil (DCNEIs) aprovadas pelo Conselho Nacional de

Educação em 2009 (Parecer CNE/CEB nº 20/09 e Resolução CNE/CEB nº 05/09), que

representam uma valiosa oportunidade para se pensar como e em que direção atuar

junto às crianças a partir de determinados parâmetros e como articular o processo

ensino-aprendizagem na Escola Básica.

As novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEIs) foram

elaboradas a partir de ampla escuta a educadores, movimentos sociais, pesquisadores

e professores universitários, que expuseram suas preocupações e anseios em relação à

Educação Infantil, considerando já haver conhecimento consistente acerca do que

pode fundamentar um bom trabalho junto às crianças. Elas destacam a necessidade de

estruturar e organizar ações educativas com qualidade, articulada com a valorização

do papel dos professores que atuam junto às crianças de 0 a 5 anos. Estes são

desafiados a construir propostas pedagógicas que, no cotidiano de creches e préescolas,

deem voz às crianças e acolham a forma delas significarem o mundo e a si

mesmas.

Dada a importância das Diretrizes como instrumento orientador da organização das

atividades cotidianas das instituições de Educação infantil, iremos apresentar alguns

de seus pontos básicos. Dialogar sobre as Diretrizes e aproximá-las da prática

pedagógica pode ajudar cada professor a criar nas unidades de Educação Infantil, junto

com seus colegas, um ambiente de crescimento e aperfeiçoamento humanos que

contemplem as crianças, suas famílias e a equipe de educadores.
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2. AS NOVAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL

O Parecer CNE/CEB nº 20/09 e a Resolução CNE/CEB nº 05/09, que definem as DCNEIs,

fazem, em primeiro lugar, uma clara explicitação da identidade da Educação Infantil,

condição indispensável para o estabelecimento de normativas em relação ao currículo

e a outros aspectos envolvidos em uma proposta pedagógica. Eles apresentam a

estrutura legal e institucional da Educação Infantil - número mínimo de horas de

funcionamento, sempre diurno, formação em magistério de todos os profissionais que

cuidam e educam as crianças, oferta de vagas próxima à residência das crianças,

acompanhamento do trabalho pelo órgão de supervisão do sistema, idade de corte

para efetivação da matrícula, número mínimo de horas diárias do atendimento - e

colocam alguns pontos para sua articulação com o Ensino Fundamental.

A versão institucional proposta nas Diretrizes se contrapõe a programas alternativos

de atendimento englobados na ideia de educação não-formal. Lembra o Parecer

CNE/CEB nº 20/09 que nem toda Política para a Infância, que requer esforços

multisetoriais integrados, é uma Política de Educação Infantil. Com isso, outras

medidas de proteção à infância devem ser buscadas fora do sistema de ensino,

embora articulada com ele, sempre que necessário.

Em segundo lugar, as Diretrizes expõem o que deve ser considerado como função

sociopolítica e pedagógica das instituições de Educação Infantil. Tais pontos refletem
grande parte das discussões na área e apontam o norte que se deseja para o trabalho


junto às crianças.

A questão pedagógica é tratada pensando que, se a Educação Infantil é parte

integrante da Educação Básica, como diz a Lei nº 9.394/96 em seu artigo 22, cujas

finalidades são desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum

indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no

trabalho e em estudos posteriores, essas finalidades devem ser adequadamente

interpretadas em relação às crianças pequenas. Nessa interpretação, as formas como

as crianças, nesse momento de suas vidas, vivenciam o mundo, constroem

conhecimentos, expressam-se, interagem e manifestam desejos e curiosidades de

modo bastante peculiares, devem servir de referência e de fonte de decisões em

relação aos fins educacionais, aos métodos de trabalho, à gestão das unidades e à

relação com as famílias.

Por outro lado, as instituições de Educação Infantil, assim como todas as demais

instituições nacionais, devem assumir responsabilidades na construção de uma

sociedade livre, justa, solidária e que preserve o meio ambiente, como parte do

projeto de sociedade democrática desenhado na Constituição Federal de 1988 (artigo

3, inciso I). Elas devem ainda trabalhar pela redução das desigualdades sociais e

regionais e a promoção do bem de todos (artigo 3 incisos II e IV da Constituição

Federal). Contudo, esses compromissos a serem perseguidos pelos sistemas de ensino

e pelos professores também na Educação Infantil enfrentam uma série de desafios,

como a desigualdade de acesso às creches e pré-escolas entre as crianças brancas e

negras, ricas e pobres, moradoras do meio urbano e rural, das regiões sul/sudeste e

norte/nordeste. Também as condições desiguais da qualidade da educação oferecida

às crianças em creches e pré-escolas impedem que os direitos constitucionais das
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crianças sejam garantidos a todas elas. Todos os esforços então se voltam para uma

ação coletiva de superação dessas desigualdades.

Em terceiro lugar as Diretrizes partem de uma definição de currículo e apresentam

princípios básicos orientadores de um trabalho pedagógico comprometido com a

qualidade e a efetivação de oportunidades de desenvolvimento para todas as crianças.

Elas explicitam os objetivos e condições para a organização curricular, consideram a

educação infantil em instituições criadas em territórios não-urbanos, a importância da

parceria com as famílias, as experiências que devem ser concretizadas em práticas

cotidianas nas instituições e fazem recomendações quanto aos processos de avaliação

e de transição da criança ao longo de sua trajetória na Educação Básica. Vejamos cada

um desses pontos.
3. OS OBJETIVOS GERAIS E A FUNÇÃO SOCIOPOLÍTICA E PEDAGÓGICA DAS


INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL

As novas DCNEIs consideram que a função sociopolítica e pedagógica das unidades de

Educação Infantil inclui (Resolução CNE/CEB nº 05/09 artigo 7º):

a. Oferecer condições e recursos para que as crianças usufruam seus direitos

civis, humanos e sociais.

b. Assumir a responsabilidade de compartilhar e complementar a educação e

cuidado das crianças com as famílias.
c. Possibilitar tanto a convivência entre crianças e entre adultos e crianças


quanto à ampliação de saberes e conhecimentos de diferentes naturezas.
d. Promover a igualdade de oportunidades educacionais entre as crianças de


diferentes classes sociais no que se refere ao acesso a bens culturais e às

possibilidades de vivência da infância;
e. Construir novas formas de sociabilidade e de subjetividade comprometidas


com a ludicidade, a democracia, a sustentabilidade do planeta e com o

rompimento de relações de dominação etária, socioeconômica, étnicoracial,

de gênero, regional, lingüística e religiosa.

Nessa definição, foram integrados compromissos construídos na área em diferentes

momentos históricos, mas articulados em uma visão inovadora e instigante do

processo educacional. Não só a questão da família foi contemplada, como também a

questão da criança como um sujeito de direitos a serem garantidos, incluindo o direito

desde o nascimento a uma educação de qualidade no lar e em instituições escolares.

O foco do trabalho institucional vai em direção da ampliação de conhecimentos e

saberes de modo a promover igualdade de oportunidades educacionais às crianças de

diferentes classes sociais e no compromisso de que a sociabilidade cotidianamente

proporcionada às crianças lhes possibilite se perceber como sujeitos marcados pelas

ideias de democracia e de justiça social, e se apropriar de atitudes de respeito às

demais pessoas, lutando quanto a qualquer forma de exclusão social.

A colocação dessa tarefa requer uma forma de organização dos ambientes de

aprendizagem que, na perspectiva do sistema de ensino, é orientada pelo currículo.
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4. CURRÍCULO E PROPOSTA PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

O debate sobre o currículo na Educação Infantil tem gerado muitas controvérsias entre

os professores de creches e pré-escolas e outros educadores e profissionais afins. Além

de tal debate incluir diferentes visões de criança, de família, e de funções da creche e

da pré-escola, para muitos educadores e especialistas que trabalham na área, a

Educação Infantil não deveria envolver-se com a questão de currículo, termo em geral

associado à escolarização tal como vivida no ensino fundamental e médio e associado

à ideia de disciplinas, de matérias escolares.

Receosos de importar para a Educação Infantil uma estrutura e uma organização que

têm sido hoje muito criticadas, preferem usar a expressão ‘projeto pedagógico’ para se

referir à orientação dada ao trabalho com as crianças em creches ou pré-escolas.

Ocorre que hoje todos os níveis da Escola Básica estão repensando sua forma de

trabalhar o processo ensino-aprendizagem e rediscutindo suas concepções de

currículo. Com isso, as críticas em relação ao modo como a concepção de currículo

vinha sendo trabalhada nas escolas não ficam restritas aos educadores da Educação

Infantil, mas são assumidas por vários setores que trabalham no Ensino Fundamental e

Médio, etapas que, inclusive, estão também revendo suas diretrizes curriculares.

Por sua vez, nos últimos 20 anos, foi se acumulando uma série de conhecimentos

sobre as formas de organização do cotidiano das unidades de Educação Infantil de

modo a promover o desenvolvimento das crianças. Finalmente, a integração das

creches e pré-escolas no sistema da educação formal impõe à Educação Infantil

trabalhar com o conceito de currículo, articulando-o com o de projeto pedagógico.

O projeto pedagógico é o plano orientador das ações da instituição. Ele define as

metas que se pretende para o desenvolvimento dos meninos e meninas que nela são

educados e cuidados. É um instrumento político por ampliar possibilidades e garantir

determinadas aprendizagens consideradas valiosas em certo momento histórico.

Para alcançar as metas propostas em seu projeto pedagógico, a instituição de

Educação Infantil organiza seu currículo. Este, nas DCNEIs, é entendido como “as

práticas educacionais organizadas em torno do conhecimento e em meio às relações

sociais que se travam nos espaços institucionais, e que afetam a construção das

identidades das crianças”. O currículo busca articular as experiências e os saberes das

crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico,

científico e tecnológico da sociedade por meio de práticas planejadas e

permanentemente avaliadas que estruturam o cotidiano das instituições.

Esta definição de currículo foge de versões já superadas de conceber listas de

conteúdos obrigatórios, ou disciplinas estanques, de pensar que na Educação infantil

não há necessidade de qualquer planejamento de atividades onde o que rege é um

calendário voltado a comemorar determinadas datas sem avaliar o sentido das

mesmas e o valor formativo dessas comemorações, e também da ideia de que o saber

do senso comum é o que deve ser tratado com crianças pequenas.
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A definição de currículo defendida nas Diretrizes põe o foco na ação mediadora da

instituição de Educação infantil como articuladora das experiências e saberes das

crianças e os conhecimentos que circulam na cultura mais ampla e que despertam o

interesse das crianças. Tal definição inaugura então um importante período na área,

que pode de modo inovador avaliar e aperfeiçoar as práticas vividas pelas crianças nas

unidades de Educação Infantil.

O cotidiano dessas unidades, enquanto contextos de vivência, aprendizagem e

desenvolvimento, requer a organização de diversos aspectos: os tempos de realização

das atividades (ocasião, freqüência, duração), os espaços em que essas atividades

transcorrem (o que inclui a estruturação dos espaços internos, externos, de modo a

favorecer as interações infantis na exploração que fazem do mundo), os materiais

disponíveis e, em especial, as maneiras do professor exercer seu papel (organizando o

ambiente, ouvindo as crianças, respondendo-lhes de determinada maneira,

oferecendo-lhes materiais, sugestões, apoio emocional, ou promovendo condições

para a ocorrência de valiosas interações e brincadeiras criadas pelas crianças etc.). Tal

organização necessita seguir alguns princípios e condições apresentados pelas

Diretrizes.

5. A VISÃO DE CRIANÇA E SEU DESENVOLVIMENTO

Um conjunto de representações, valores e conceitos que expressam alguns pontos de

consenso na área em relação à criança, e o papel do professor face aos processos de

desenvolvimento e aprendizagem das crianças está por trás das orientações defendidas

pelas Diretrizes.

A criança, centro do planejamento curricular, é considerada um sujeito histórico e de

direitos. Ela se desenvolve nas interações, relações e práticas cotidianas a ela

disponibilizadas e por ela estabelecidas com adultos e crianças de diferentes idades nos

grupos e contextos culturais nos quais se insere. A maneira como ela é alimentada, se

dorme com barulho ou no silêncio, se outras crianças ou adultos brincam com ela ou se

fica mais tempo quietinha, as entonações de voz e contatos corporais que ela reconhece

nas pessoas que a tratam, o tipo de roupa que ela usa, os espaços mais abertos ou

restritos em que costuma ficar, os objetos que manipula, o modo como conversam com

ela, etc. – são elementos da história de seu desenvolvimento em uma cultura.

A atividade da criança não se limita à passiva incorporação de elementos da cultura, mas

ela afirma sua singularidade atribuindo sentidos a sua experiência através de diferentes

linguagens, como meio para seu desenvolvimento em diversos aspectos (afetivos,

cognitivos, motores e sociais). Assim a criança busca compreender o mundo e a si mesma,

testando de alguma forma as significações que constrói, modificando-as continuamente

em cada interação, seja com outro ser humano, seja com objetos. Em outras palavras, a

criança desde pequena não só se apropria de uma cultura, mas o faz de um modo

próprio, construindo cultura por sua vez.

Outro ponto importante em relação à aprendizagem infantil considera que as habilidades

para a criança discriminar cores, memorizar poemas, representar uma paisagem através

de um desenho, consolar um coleguinha que chora etc., não são fruto de maturação
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orgânica, mas são produzidas nas relações que as crianças estabelecem com o mundo

material e social, mediadas por parceiros diversos, conforme buscam atender suas

necessidades no processo de produção de objetos, ideias, valores, tecnologias.

Assim, as experiências vividas no espaço de Educação Infantil devem possibilitar o

encontro de explicações pela criança sobre o que ocorre à sua volta e consigo mesma

enquanto desenvolvem formas de sentir, pensar e solucionar problemas. Nesse processo

é preciso considerar que as crianças necessitam envolver-se com diferentes linguagens e

valorizar o lúdico, as brincadeiras, as culturas infantis. Não se trata assim de transmitir à

criança uma cultura considerada pronta, mas de oferecer condições para ela se apropriar

de determinadas aprendizagens que lhe promovem o desenvolvimento de formas de agir,

sentir e pensar que são marcantes em um momento histórico.

Quando o professor ajuda as crianças a compreender os saberes envolvidos na resolução

de certas tarefas – tais como empilhar blocos, narrar um acontecimento, recontar uma

história, fazer um desenho, consolar outra criança que chora, etc. - são criadas condições

para desenvolvimento de habilidades cada vez mais complexas pelas crianças, que têm

experiências de aprendizagem e desenvolvimento diferentes de crianças que têm menos

oportunidades de interação e exploração.

Face essa visão de criança, o desafio que se coloca para a elaboração curricular e para sua

efetivação cotidiana é transcender a prática pedagógica centrada no professor e

trabalhar, sobretudo, a sensibilidade deste para uma aproximação real da criança,

compreendendo-a do ponto de vista dela, e não da do adulto.

O impacto das práticas educacionais no desenvolvimento das crianças se faz por meio das

relações sociais que as crianças desde bem pequenas estabelecem com os professores e

as outras crianças e que afetam a construção de suas identidades. Em função disso, a

preocupação básica do professor deve ser garantir às crianças oportunidades de

interação com companheiros de idade dado que elas aprendem coisas que lhes são muito

significativas quando interagem com companheiros da infância e que são diversas das

coisas que elas se apropriam no contato com os adultos ou com crianças já mais velhas. À

medida que o grupo de crianças interage, são construídas as culturas infantis.

Além de reconhecer o valor das interações das crianças com outras crianças e com

parceiros adultos, e a importância de se olhar para as práticas culturais em que as

crianças se envolvem, as DCNEIs ainda destacam a brincadeira como atividade

privilegiada na promoção do desenvolvimento nesta fase da vida humana.

Brincar dá à criança oportunidade para imitar o conhecido e construir o novo, conforme

ela reconstrói o cenário necessário para que sua fantasia se aproxime ou se distancie da

realidade vivida, assumindo personagens e transformando objetos pelo uso que deles faz.

Na brincadeira de faz-de-conta se produz um tipo de comunicação rica em matizes e que

possibilita às crianças indagar sobre o mundo a sobre si mesma e por à prova seus

conhecimentos no uso interativo de objetos e conversações. Através das brincadeiras e

outras atividades cotidianas que ocorrem nas instituições de Educação infantil, a criança

aprende a assumir papéis diferentes e, ao se colocar no lugar do outro, aprende a

coordenar seu comportamento com os de seus parceiros e a desenvolver habilidades

variadas, construindo sua Identidade.
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O campo de aprendizagens que as crianças podem realizar na Educação Infantil é muito

grande. As situações cotidianas criadas nas creches e pré-escolas podem ampliar as

possibilidades das crianças viverem a infância e aprender a conviver, brincar e

desenvolver projetos em grupo, expressar-se, comunicar-se, criar e reconhecer novas

linguagens, ouvir e recontar histórias lidas, ter iniciativa para escolher uma atividade,

buscar soluções para problemas e conflitos, ouvir poemas, conversar sobre o crescimento

de algumas plantas que são por elas cuidadas, colecionar objetos, participar de

brincadeiras de roda, brincar de faz-de-conta de casinha ou de ir à venda, calcular

quantas balas há em uma vasilha para distribuí-las pelas crianças presentes, aprender a

arremessar uma bola em um cesto, cuidar de sua higiene e de sua organização pessoal,

cuidar dos colegas que necessitam ajuda e do ambiente, compreender suas emoções e

sua forma de reagir às situações, construir as primeiras hipóteses, por exemplo, sobre o

uso da linguagem escrita, e formular um sentido de si mesmo.

Finalmente, considerar as crianças concretas no planejamento curricular das instituições

de Educação infantil significa também compreender seus grupos culturais, em particular

suas famílias. Creches e pré-escolas, ao possibilitar às crianças uma vivência social diversa

da experiência no grupo familiar, desempenham importante papel na formação da

personalidade da criança. É bom lembrar, no entanto, que os contextos coletivos de

educação para crianças pequenas diferem do ambiente familiar e requerem formas de

organizá-lo diferentes do modelo de substituto materno, anteriormente usado para

analisar o trabalho em creches e escolas maternais.

As instituições precisam conhecer a comunidade atendida, as culturas plurais que

constituem o espaço da creche e da pré-escola, a riqueza das contribuições familiares e

da comunidade, as crenças e manifestações dessa comunidade, enfim, os modos de vida

das crianças vistas como seres concretos e situados em espaços geográficos e grupos

culturais específicos. Esse princípio reforça a gestão democrática como elemento

imprescindível, uma vez que é por meio dela que a instituição também se abre à

comunidade, permite sua entrada, e possibilita sua participação na elaboração e

acompanhamento da proposta curricular.

A gestão democrática da proposta curricular deve contar na sua elaboração,

acompanhamento e avaliação tendo em vista o Projeto Político-pedagógico da unidade

educacional, com a participação coletiva de professoras e professores, demais

profissionais da instituição, famílias, comunidade e das crianças, sempre que possível e à

sua maneira.
6. AS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS DA EDUCAÇÃO INFANTIL


Para orientar as unidades de Educação Infantil a planejar seu cotidiano, as Diretrizes

apontam um conjunto de princípios defendidos pelos diversos segmentos ouvidos no

processo de sua elaboração e que devem orientar o trabalho nas instituições de Educação

Infantil. Dada sua importância na consolidação de práticas pedagógicas que atendam aos

objetivos gerais da área, eles serão aqui apresentados em detalhes. São eles:
7 Agosto/2010

Princípios éticos – valorização da autonomia, da responsabilidade, da


solidariedade e do respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às

diferentes culturas, identidades e singularidades.
Princípios políticos – garantia dos direitos de cidadania, do exercício da


criticidade e do respeito à ordem democrática.
Princípios estéticos – valorização da sensibilidade, da criatividade, da


ludicidade e da diversidade de manifestações artísticas e culturais.

Para apontar formas de operacionalização destes princípios, o texto do Parecer das

Diretrizes remete à adoção de uma série de medidas voltadas a garantir certos objetivos e

certa metodologia no trabalho didático. Vejamos:

a) Cabe às instituições de Educação Infantil, de acordo com os princípios éticos:

- assegurar às crianças a manifestação de seus interesses, desejos e curiosidades

ao participar das práticas educativas;

- valorizar suas produções, individuais e coletivas;

- apoiar a conquista pelas crianças de autonomia na escolha de brincadeiras e de

atividades e para a realização de cuidados pessoais diários;

- proporcionar às crianças oportunidades para:
· ampliar as possibilidades de aprendizado e de compreensão de mundo e de si próprio


trazidas por diferentes tradições culturais,
· construir atitudes de respeito e solidariedade, fortalecendo a auto-estima e os vínculos


afetivos de todas as crianças, combatendo preconceitos que incidem sobre as diferentes

formas dos seres humanos se constituírem enquanto pessoas.
· aprender sobre o valor de cada pessoa e dos diferentes grupos culturais;

· adquirir valores como os da inviolabilidade da vida humana, a liberdade e a integridade


individuais, a igualdade de direitos de todas as pessoas, a igualdade entre homens e

mulheres, assim como a solidariedade com grupos enfraquecidos e vulneráveis política e

economicamente.
· respeitar todas as formas de vida, o cuidado de seres vivos e a preservação dos recursos


naturais.

b) Para a concretização dos princípios políticos apontados para a área, a instituição

de Educação Infantil deve trilhar o caminho de educar para a cidadania, analisando suas

práticas educativas de modo a:
· promover a formação participativa e crítica das crianças

· criar contextos que permitam às crianças a expressão de sentimentos,


ideias, questionamentos, comprometidos com a busca do bem estar

coletivo e individual, com a preocupação com o outro e com a

coletividade.
· criar condições para que a criança aprenda a opinar e a considerar os


sentimentos e a opinião dos outros sobre um acontecimento, uma

reação afetiva, uma ideia, um conflito.
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· garantir uma experiência bem sucedida de aprendizagem a todas as


crianças, sem discriminação e lhes proporcionar oportunidades para o

alcance de conhecimentos básicos que são considerados aquisições

valiosas para elas.
c) O trabalho pedagógico na unidade de Educação Infantil, em relação aos


princípios estéticos deve voltar-se para:
· valorizar o ato criador e a construção pelas crianças de respostas


singulares, garantindo-lhes a participação em diversificadas

experiências;
· organizar um cotidiano de situações agradáveis, estimulantes, que


desafiem o que cada criança e seu grupo de crianças já sabem sem

ameaçar sua autoestima nem promover competitividade;
· ampliar as possibilidades da criança de cuidar e ser cuidada, de se


expressar, comunicar e criar, de organizar pensamentos e ideias, de

conviver, brincar e trabalhar em grupo, de ter iniciativa e buscar

soluções para os problemas e conflitos que se apresentam às mais

diferentes idades;
· possibilitar às crianças apropriar-se de diferentes linguagens e saberes


que circulam em nossa sociedade, selecionados pelo valor formativo

que possuem em relação aos objetivos definidos em seu projeto político

pedagógico.

Os princípios expostos devem sustentar as práticas de Educação infantil e privilegiar

aprendizagens como: ser solidário com todos os colegas, respeitá-los, não discriminá-los e

saber por que isto é importante, aprender a fazer comentários positivos e produtivos ao

trabalho dos colegas, a apreciar suas próprias produções e a expor a adultos e crianças o

modo como as fez.

Na integração dessas metas, “a proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil

deve ter como objetivo principal promover o desenvolvimento integral das crianças de

zero a cinco anos de idade garantindo a cada uma delas o acesso a processos de

construção de conhecimentos e a aprendizagem de diferentes linguagens, assim como o

direito à proteção, à saúde, à liberdade, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à

convivência e interação com outras crianças” (Resolução CNE/CEB nº 05/09, art.8º).

Nessa direção as práticas cotidianas na Educação Infantil devem:
· considerar a integralidade e indivisibilidade das dimensões expressivo-motora,


afetiva, cognitiva, lingüística, ética, estética e sociocultural das crianças,
· apontar as experiências de aprendizagem que se espera promover junto às


crianças e
· efetivar-se por meio de modalidades de experiências que assegurem as metas


educacionais de seu projeto pedagógico.

7. SUBSÍDIOS PARA A ELABORAÇÃO DO CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
9 Agosto/2010


O trabalho pedagógico organizado em creche ou pré-escola em que cuidar e educar são

aspectos integrados, se faz pela criação de um ambiente em que a criança se sinta segura,

satisfeita em suas necessidades, acolhida em sua maneira de ser, onde ela possa

trabalhar de forma adequada suas emoções e lidar com seus medos, sua raiva, seus

ciúmes, sua apatia ou hiperatividade, e possa construir hipóteses sobre o mundo e

elaborar sua Identidade.

A meta do trabalho pedagógico nas instituições de Educação infantil é apoiar as crianças,

desde cedo e ao longo de todas as suas experiências cotidianas, no estabelecimento de

uma relação positiva com a instituição educacional, no fortalecimento de sua autoestima,

interesse e curiosidade pelo conhecimento do mundo, na familiaridade com

diferentes linguagens, e na aceitação e acolhimento das diferenças entre as pessoas.

Para garantir às crianças seu direito de viver a infância e se desenvolver creches e préescolas

devem organizar situações agradáveis, estimulantes, que ampliem as

possibilidades infantis de cuidar de si e de outrem, de se expressar, comunicar e criar, de

organizar pensamentos e ideias, de conviver, brincar e trabalhar em grupo, de ter

iniciativa e buscar soluções para os problemas e conflitos que se apresentam às mais

diferentes idades, desde muito cedo. O ambiente deve ser rico de experiências para

exploração ativa e compartilhada por crianças e professores, que constroem significações

nos diálogos que estabelecem.

Desses pontos decorrem algumas condições para a organização curricular das instituições

de Educação Infantil. Elas devem, segundo as Diretrizes:
o assegurar a educação de modo integral, entendendo o cuidado como


algo indissociável ao processo educativo.
o combater o racismo e as discriminações de gênero, sócio-econômicas,


étnico-raciais e religiosas
o conhecer as culturas plurais que constituem o espaço da creche e da


pré-escola, a riqueza das contribuições familiares e da comunidade,

suas crenças e manifestações, e fortalecer formas de atendimento

articuladas aos saberes e às especificidades étnicas, lingüísticas,

culturais e religiosas de cada comunidade.
o dar atenção cuidadosa e exigente às possíveis formas de violação da


dignidade da criança.
o cumprir o dever do Estado com a garantia de uma experiência educativa


com qualidade a todas as crianças na Educação Infantil.

Com base nessas condições, as DCNEIs apontam que as instituições de Educação Infantil,

na organização de sua proposta pedagógica e curricular, necessitam:
· garantir espaços e tempos para participação, o diálogo e a escuta cotidiana das


famílias, o respeito e a valorização das diferentes formas em que elas se

organizam.
· trabalhar com os saberes que as crianças vão construindo ao mesmo tempo em


que se garante a apropriação ou construção por elas de novos conhecimentos.
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· considerar a brincadeira como a atividade fundamental nessa fase do


desenvolvimento e criar condições para que as crianças brinquem diariamente.
· propiciar experiências promotoras de aprendizagem e conseqüente


desenvolvimento das crianças em uma freqüência regular.
· selecionar aprendizagens a serem promovidas com as crianças, não as


restringindo a tópicos tradicionalmente valorizados pelos professores, mas

ampliando-as na direção do aprendizado delas para assumir o cuidado pessoal,

fazer amigos, e conhecer suas próprias preferências e características.
· organizar os espaços, tempos, materiais e as interações nas atividades


realizadas para que as crianças possam expressar sua imaginação nos gestos,

no corpo, na oralidade e/ou na língua de sinais, no faz de conta, no desenho,

na dança, e em suas primeiras tentativas de escrita.
· considerar no planejamento do currículo as especificidades e os interesses


singulares e coletivos dos bebês e das crianças das demais faixas etárias,

vendo a criança em cada momento como uma pessoa inteira na qual os

aspectos motores, afetivos, cognitivos e lingüísticos integram-se, embora em

permanente mudança.
· abolir todos os procedimentos que não reconhecem a atividade criadora e o


protagonismo da criança pequena, e que promovam atividades mecânicas e

não significativas para as crianças.
· oferecer oportunidade para que a criança, no processo de elaborar sentidos


pessoais, se aproprie de elementos significativos de sua cultura não como

verdades absolutas, mas como elaborações dinâmicas e provisórias.
· criar condições para que as crianças participem de diversas formas de


agrupamento (grupos de mesma idade e grupos de diferentes idades),

formados com base em critérios estritamente pedagógicos, respeitando o

desenvolvimento físico, social e linguístico de cada criança.
· possibilitar oportunidades para a criança fazer deslocamentos e movimentos


amplos nos espaços internos e externos às salas de referência das turmas e à

instituição, e para envolver-se em exploração e brincadeiras.
· oferecer objetos e materiais diversificados às crianças, que contemplem as


particularidades dos bebês e das crianças maiores, as condições específicas das

crianças com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas

habilidades/superdotação, e as diversidades sociais, culturais, étnico-raciais e

lingüísticas das crianças, famílias e comunidade regional.
· organizar oportunidades para as crianças brincarem em pátios, quintais, praças,


bosques, jardins, praias, e viverem experiências de semear, plantar e colher os

frutos da terra, permitindo-lhes construir uma relação de identidade,

reverência e respeito para com a natureza.
· possibilitar o acesso das crianças a espaços culturais diversificados e a práticas


culturais da comunidade, tais como apresentações musicais, teatrais,
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fotográficas e plásticas, e visitas a bibliotecas, brinquedotecas, museus,

monumentos, equipamentos públicos, parques, jardins.

Um tópico a ser destacado diz respeito às experiências de aprendizagem que podem ser

promovidas. Elas são descritas no artigo 9º da Resolução CNE/CEB nº5/09 enquanto

experiências que podem ser selecionadas para compor a proposta curricular das unidades

de Educação infantil.

As experiências apontadas visam promover oportunidades para cada criança conhecer o

mundo e a si mesma, aprender a participar de atividades individuais e coletivas, a cuidar

de si e a organizar-se. Visam introduzir as crianças em práticas de criação e comunicação

por meio de diferentes formas de expressão, tais como imagens, canções e música,

teatro, dança e movimento, assim como a língua escrita e falada, sem esquecer da língua

de sinais, que pode ser aprendida por todas as crianças e não apenas pelas crianças

surdas. Conforme as crianças se apropriam das diferentes linguagens, que se interrelacionam,

ela amplia seus conhecimentos sobre o mundo e registram suas descobertas

pelo desenho, modelagem, ou mesmo por formas bem iniciais de registro escrito.

Também a satisfação do desejo infantil de explorar e conhecer o mundo da natureza, da

sociedade e da matemática, e de apropriar-se de formas elementares de lidar com

quantidades e com medidas deve ser atendida de modo adequado às formas das crianças

elaborarem conhecimento de modo ativo, criativo.

Todas essas preocupações, além de marcar significativamente todas as instituições de

Educação Infantil do país, devem ainda estar presentes em três situações que são

apontadas nas DCNEIs:

1) O compromisso com uma Educação infantil de qualidade para todas as crianças não

pode deixar de ressaltar o trabalho pedagógico com as crianças com deficiência,

transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Em relação a

elas o planejamento das situações de vivência e aprendizagem na Educação Infantil deve:
o garantir-lhes o direito à liberdade e à participação enquanto sujeitos


ativos,
o ampliar suas possibilidades de ação nas brincadeiras e nas interações com


as outras crianças, momentos em que exercitam sua capacidade de

intervir na realidade e participam das atividades curriculares com os

colegas,
o garantir-lhes a acessibilidade de espaços, materiais, objetos e brinquedos,


procedimentos e formas de comunicação a suas especificidades e

singularidades,
o estruturar os ambientes de aprendizagem de modo a proporcionar-lhes


condições para participar de todas as propostas com as demais crianças,
o garantir-lhes condições para interagir com os companheiros e com o


professor;
o preparar cuidadosamente atividades que tenham uma função social


imediata e clara para elas.
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o organizar atividades diversificadas em seqüências que lhes possibilitem a


retomada de passos já dados;
o preparar o espaço físico de modo que ele seja funcional e possibilite


locomoções e explorações;
o cuidar para que elas possam ser ajudadas da forma mais conveniente no


aprendizado de cuidar de si, o que inclui a aquisição de autonomia e o

aprendizado de formas de assegurar sua segurança pessoal;
o estabelecer rotinas diárias e regras claras para melhor orientá-las.

o estimular a participação delas em atividades que envolvam diferentes


linguagens e habilidades, como dança, canto, trabalhos manuais, desenho

etc., e promover-lhes variadas formas de contato com o meio externo;
o dar-lhes oportunidade de ter condições instrucionais diversificadas:


trabalho em grupo, aprendizado cooperativo, uso de tecnologias,

diferentes metodologias e diferentes estilos de aprendizagem.
o oferecer, sempre que necessário, materiais adaptados para elas terem um


melhor desempenho.
o garantir o tempo que elas necessitam para realizar cada atividade,


recorrendo a tarefas concretas e funcionais por meio de metodologias de

ensino mais flexíveis e individualizadas, embora não especialmente

diferentes das que são utilizadas com as outras crianças;
o realizar uma avaliação processual que acompanhe suas aprendizagens


com base em suas capacidades e habilidades, e não em suas limitações, tal

como deve ocorrer para qualquer criança.
o estabelecer contato freqüente com suas famílias para melhor


coordenação de condutas, troca de experiências e de informações.

O importante é reconhecer que a Educação Inclusiva só se efetiva se os ambientes de

aprendizagem forem sensíveis às questões individuais e grupais, e onde as diferentes

crianças possam ser atendidas em suas necessidades específicas de aprendizagem, sejam

elas transitórias ou não, por meio de ações adequadas a cada situação.

2) A Educação infantil deve atender a demanda das populações do campo, dos povos da

floresta e dos rios, indígenas, quilombolas por uma educação e cuidado de qualidade para

seus filhos. O trabalho pedagógico de creches e pré-escolas instaladas nas áreas onde

estas populações vivem precisa reconhecer a constituição plural das crianças brasileiras

no que se refere à identidade cultural e regional e à filiação socioeconômica, étnico-racial,

de gênero, regional, lingüística e religiosa. Para tanto ele deve:
o estabelecer uma relação orgânica com a cultura, as tradições, os saberes e


as identidades das diversas populações,
o adotar estratégias que garantam o atendimento às especificidades das


comunidades do campo, quilombolas, ribeirinhas e outras - tais como a

flexibilização e adequação no calendário, nos agrupamentos etários e na

organização de tempos, atividades e ambientes - em respeito às

diferenças quanto à atividade econômica e à política de igualdade, e sem
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prejuízo da qualidade do atendimento, com oferta de materiais didáticos,

brinquedos e outros equipamentos em conformidade com a realidade das

populações atendidas, evidenciando ainda o papel dessas populações na

produção de conhecimento sobre o mundo.

Esta demanda por ampliação da Educação Infantil para além dos territórios urbanos é

nova e se integra à preocupação em garantir às populações do campo e indígena, e aos

afrodescendentes, uma educação que considere os saberes de cada comunidade, ou

grupo cultural, em produtiva interação com os saberes que circulam nos centros urbanos,

igualmente marcados por uma ampla diversidade cultural.
3) Quando oferecidas, aceitas e requisitadas pelas comunidades indígenas, as propostas


curriculares na Educação Infantil devem:
o proporcionar às crianças indígenas uma relação viva com os


conhecimentos, crenças, valores, concepções de mundo e as memórias de

seu povo;
o reafirmar a identidade étnica e a língua como elementos de sua


constituição;
o dar continuidade à educação tradicional oferecida na família e articular-se


às práticas sócio-culturais de educação e cuidado coletivos da

comunidade;
o adequar calendário, agrupamentos etários e organização de tempos,


atividades e ambientes de modo a atender as demandas de cada povo

indígena.

8. A AVALIAÇÃO E A CONTINUIDADE DOS PROCESSOS DE APRENDIZAGEM DAS

CRIANÇAS

Na Educação Infantil a avaliação da aprendizagem é instrumento de reflexão sobre a

prática pedagógica na busca pelo professor de melhores caminhos para orientar as

crianças, conforme ele pesquisa que elementos podem estar contribuindo, ou

dificultando, as possibilidades de expressão da criança, sua aprendizagem e

desenvolvimento.

As DCNEIs consideram que a avaliação deve ser processual e incidir sobre todo o contexto

de aprendizagem: as atividades propostas e o modo como foram realizadas, as instruções

e os apoios oferecidos às crianças individualmente e ao coletivo de crianças, a forma

como o professor respondeu às manifestações e às interações das crianças, os

agrupamentos que as crianças formaram, o material oferecido e o espaço e o tempo

garantidos para a realização das atividades.

Conhecer as preferências das crianças, a forma delas participarem nas atividades, seus

parceiros prediletos para a realização de diferentes tipos de tarefas, suas narrativas, e

outros pontos pode ajudar o professor a reorganizar as atividades de modo mais

adequado ao alcance dos propósitos infantis e das aprendizagens coletivamente
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trabalhadas. Ele poderá então fortalecer, ou modificar, a situação, de modo a efetivar o

projeto político pedagógico de cada instituição.

A avaliação deve se basear na observação sistemática dos comportamentos de cada

criança, das brincadeiras e interações das crianças no cotidiano, com utilização de

múltiplos registros realizados por adultos e crianças (relatórios, fotografias, desenhos,

álbuns etc.), feita ao longo do período em muitos e diversificados momentos.

A documentação dessas observações e outros dados sobre a aprendizagem da criança

devem acompanhá-la ao longo de sua trajetória da Educação Infantil e ser entregue por

ocasião de sua matrícula no Ensino Fundamental, para garantir uma atenção continuada

ao processo de aprendizagem e desenvolvimento da criança e compromissada em

apontar possibilidades de avanços.

Para garantir a continuidade dos processos de aprendizagem das crianças, devem ser

criadas estratégias adequadas aos diferentes momentos de transição vividos pela criança

quando de seu ingresso na instituição de Educação infantil, considerando a necessária

adaptação das crianças e seus responsáveis às práticas e relacionamentos que têm lugar

naquele espaço, e visar o conhecimento de cada criança e de sua família pela equipe da

Instituição, de suas mudanças de turmas no interior da instituição, e sua transição da

creche e a da pré-escola, e desta para o Ensino Fundamental.

9. E COMO COMEÇAR?

O dinamismo hoje presente na área de Educação infantil, ao mesmo tempo em que tem

criado esperanças, invoca a necessidade de ampliação dos processos de formação

continuada para qualificar as práticas pedagógicas existentes na direção proposta. Muitas

instituições encontram-se presas a modelos que já foram avaliados e julgados

inadequados como instrumentos de educar e cuidar e promover o desenvolvimento das

crianças. Em parte a presença desses modelos é devida à longa tradição assistencialista

presente no processo de constituição da área de Educação Infantil, em particular em

relação à creche, o que prejudicou a elaboração modelos pedagógicos mais afinados com

as formas de promoção do desenvolvimento infantil.

Outro fator presente quando se pensa na necessidade de se ter outra forma de trabalho

junto às crianças, é a ausência de uma política de formação específica para os

profissionais da Educação Infantil nos cursos de Pedagogia com uma explicitação clara de

suas atribuições junto às crianças, particularmente em relação aquelas com idade entre

zero a três anos.

Ao final desta apresentação das diretrizes, nossa aposta é pelo grande e estimulante

envolvimento dos educadores que atuam na área na reflexão sobre as práticas cotidianas

vividas pelas crianças nas instituições de Educação infantil e pela busca de formas de

trabalho pedagógico que possam caminhar na direção pretendida. Cabe aos sistemas de

ensino e às instituições formadoras de professores dar-lhes as melhores condições para

essa atuação sensível às novas exigências da área.

Se hoje algumas instituições já se encontram bem avançadas na concretização de suas

propostas de modo compatível com as normativas trazidas pelas novas Diretrizes, outras
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instituições podem desde já se envolver em amplo processo de renovação de práticas, de

revolução de representações cristalizadas sobre a criança, as expectativas acerca do que

ela pode aprender. Afinal, não apenas as crianças são sujeitos do processo de

aprendizagem, mas também seus professores se incluem no fascinante processo de ser

um eterno aprendiz, um construtor de sua profissionalidade.
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